O impacto da cultura de tecidos na agricultura

28-05-2014 19:30
 

A cultura de tecidos de plantas pode ser caracterizada como uma ferramenta tecnológica, de intensa aplicação nos programas de melhoramento genético vegetal, abrangendo um conjunto de procedimentos que fazem parte de um grupo de “tecnologias-chaves” conhecido hoje como “biotecnologia vegetal”, sendo esta identificada como uma das revoluções científicas do século XX.

 

Os estudos pioneiros para o crescimento e desenvolvimento da cultura de tecidos em plantas iniciaram no final da década de 1930, e, em 1965, foi relatada a primeira regeneração de plantas inteiras a partir da cultura de células isoladas, consolidando o fenômeno da totipotência das células vegetais. A totipotência, por sua vez, se caracteriza como um fenômeno das células vegetais que, sob estímulos específicos e em condições assépticas, segmentos de tecidos ou células de uma determinada planta conseguem se desenvolver e dar origem a um novo indivíduo (uma nova planta), sem ocorrer a fusão de gametas.

 

Com o decorrer dos anos, a aplicação da cultura de tecidos na agricultura extrapolou a sua função de técnica destinada a auxiliar na propagação de plantas de interesse agrícola, e começou a fazer parte de uma importante área da biotecnologia, a transgenia, que, atualmente, apresenta uma das maiores aplicações práticas na agricultura. A transgenia se caracteriza por ser uma ferramenta muito versátil para o estudo dos problemas básicos e aplicados da fisiologia e bioquímica de plantas, além de se constituir no elo principal entre a inserção artificial de novos genes através de manipulações genéticas (dentro do laboratório) até seu destino final (a lavoura).

 

O impacto do domínio das técnicas de cultura de tecidos pode ser avaliado em momentos distintos. Inicialmente, podemos verificar que um dos grandes entraves vividos pelos programas de melhoramento genético de plantas se caracteriza pelo longo tempo necessário para o lançamento de uma nova cultivar. Hoje, uma vez encontrados os atributos agronômicos desejáveis em uma planta, e com os recursos da haplodiploidização (plantas homozigotas obtidas in vitro originadas de gametas), se obtém células desta mesma planta que através da cultura de tecidos são cultivadas até se obter populações de plantas inteiras, sem os resíduos de heterozigose que os procedimentos convencionais promoveriam, reduzindo o tempo de obtenção de uma nova cultivar. Outro momento importante de impacto da aplicação desta técnica foi estabelecido com o advento da biologia molecular com aplicações subsequentes da transgenia. O sucesso na modificação ou na recombinação gênica desejada (transformação genética), sobre o genótipo em estudo, seja operando sobre células individuais ou tecidos, inserindo, eliminando, super-expressando ou silenciando genes, o material trabalhado será geralmente desenvolvido numa plataforma-base de cultura de tecidos até a planta ser regenerada. Assim, muitas abordagens de cultura de tecidos, em combinação com técnicas moleculares, têm sido utilizadas com sucesso para incorporar características específicas por meio de transferência de genes. A estratégia é, com o uso destas tecnologias, aumentar ainda mais a eficiência dos programas de melhoramento genético vegetal, resultando em genótipos com características superiores, e a obtenção de novas cultivares em tempo mais reduzido.

 

De uma maneira geral, vários fatores contribuem para o desenvolvimento da agricultura como um todo e o sucesso de um programa de melhoramento de plantas participa de maneira bastante expressiva na evolução deste processo. Para se conquistar este sucesso e atingir os objetivos almejados, o conhecimento da variabilidade genética encontrada entre os genitores que serão utilizados como parentais e o grau de variação existente entre eles se faz necessário. Assim, muitos métodos de cultura de tecidos têm sido empregados para criar e explorar a variabilidade genética das plantas cultivadas, aumentando ainda mais as fontes de germoplasma disponíveis para os programas de melhoramento genético de plantas, contribuindo para o enriquecimento dos bancos de germoplasma, gerando uma variabilidade antes inexistente. Ao utilizarmos genitores com uma maior gama de variabilidade gênica, estaremos introduzindo aos materiais selecionados, fontes alternativas de características de interesse, tais como genes de tolerância e ou resistência aos mais diversos estresses de origem abiótica e biótica, proporcionando de maneira indireta um maior rendimento na produção, e incrementos significativos para todo o sistema agrícola. Muitos protocolos de cultura de tecidos específicos para viabilizar o aumento da variabilidade genética já estão disponíveis para a maioria das espécies cultivadas, embora ainda haja a necessidade de otimização de várias etapas para algumas outras culturas.

 

Para atender a demanda crescente por produtos agrícolas, associado ao avanço constante da taxa de crescimento da população mundial, programas de melhoramento genético mais eficientes com enfoques mais assertivos deverão ser adotados. Assim, a cultura de tecidos entra nesse cenário contribuindo das mais diversas formas, com exemplos amplamente adotados há várias décadas: multiplicação de gemas apicais para produção de mudas livres de vírus; produção de plantas duplo-haplóides; propagação vegetativa de espécies florestais, ornamentais e frutíferas; microenxertia; manutenção, intercâmbio e enriquecimento de germoplasma; propagação de plantas cujas sementes têm baixo poder germinativo, transformação genética, etc. Os resultados expressivos advindos das técnicas de cultura de tecidos e já consolidados nos meios científicos foram aos poucos sendo incorporados aos programas de melhoramento genético vegetal, apontando novos caminhos e gerando soluções, repercutindo diretamente no processo de renovação de cultivares com características superiores e contribuindo para o desenvolvimento da agricultura nacional.

 

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